Mobilidade
É quando surgem os verdadeiros passageiros da agonia. Porque quem não participa diretamente das discussões sobre os salários dos condutores e preços das tarifas continua sendo, na prática, o maior penalizado. Os que pagam a conta não podem todas as vezes ficar reféns de um único modal.
Tânia Passos
MobilidadePassageiros ônibus/Recife Foto – Roberto Ramos /DP/D.A. Press |
É quando surgem os verdadeiros passageiros da agonia. Porque quem não participa diretamente das discussões sobre os salários dos condutores e preços das tarifas continua sendo, na prática, o maior penalizado. Os que pagam a conta não podem todas as vezes ficar reféns de um único modal.
Na última sexta-feira, presenciei o diálogo entre duas usuárias – enquanto aguardava o almoço – preocupadas com o cenário previsto para o dia de ontem. Pelo celular, elas buscavam informações a respeito da greve. Nem mesmo a determinação do Tribunal Regional do Trabalho (TRT-PE) em garantir 100% da frota nos horários de pico servia de consolo.
A aflição era justificada e há pelo menos duas fortes razões: o modelo de negociação salarial – que sempre se estende às últimas consequências e traz prejuízo principalmente ao usuário – e a ausência de outros modais para compensar a falta do rodoviário.
Em São Paulo, mesmo a duras penas, o usuário tem o metrô que atende aos quatro cantos da cidade, além dos trens. Lá, a superlotação, no entanto, não permite que os carros dos trens sejam suficientes e nem poderiam. Não há mobilidade que resista a um único modal.
No caso de Recife, a rede de metrô com 39,5 quilômetros, voltada apenas para parte das zonas Oeste e Sul, é ainda insignificante para atender às necessidades de deslocamento da Região Metropolitana do Recife e nos deixa saudosistas da rede de 200 quilômetros de extensão dos bondes que atendia a Região Metropolitana até meados do século 20.
Quanto mais modais, melhor, e para uma cidade cortada por rios, o transporte hidroviário também atenderia uma parte da demanda, mas a obra prevista para ser entregue até junho deste ano foi adiada para 2015 e isso ainda não é certeza de nada.
A paralisação do sistema, mesmo em parte, afeta diretamente cerca de dois milhões de usuários. O trânsito também fica travado e, para piorar, a direção eleita do Sindicado dos Rodoviários, ainda não empossada, vem colocando em prática uma estratégia que consiste em orientar os motoristas para tirarem os ônibus das garagens e parar os veículos nos principais corredores de transporte. O transtorno é gigante para quem está dentro e fora dos ônibus e não tem para onde fugir. Com uma frota circulante de mais de um milhão de veículos, até a carona não parece ser uma boa ideia em dias assim.
Sem ônibus, sem barcos ou ainda metrô para todos, sobra um asfalto de incertezas, esperas e frustrações. Talvez quem menos sofra quando o ônibus deixa de circular seja o usuário de bicicleta. Mesmo sem faixas seguras, ele consegue deixar para trás os congestionamentos. Também para quem se desloca a pé em distâncias possíveis de serem vencidas, mesmo com passeios impossíveis.
Nesse cenário, uma pergunta que permanece é se os próximos julhos serão iguais. Provavelmente sim, mas não deveria. A melhoria do transporte público está diretamente ligada à qualidade e diversidade dos modais. As questões salariais entre trabalhador e empregado precisam ser definidas em lei de forma clara e segura. Para o bem de todos, principalmente do passageiro.
Fonte - Diário de Pernambuco 29/07/2014
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