Época de muita movimentação, que nos remexe, fazendo-nos recordar e revisitar nostalgicamente o passado, descobrimos uma ponta de saudades das antigas inquietações que nos moviam.A não percepção das conexões entre as partes que “ligam” a cidade, foi acontecendo pela ruptura urbana causada pelos espaços de circulação cada vez mais vorazmente alargados
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Antigas idéias, pensamentos e preocupações intelectuais/acadêmicas, que instigaram e inquietaram em outros tempos - difíceis à época, agora, décadas depois, parecem ser mais bem compreendidas e
palatáveis.
Falo da compreensão política do espaço urbano, seu uso e as implicações da dinâmica e das intervenções no comportamento humano, que sempre foram temática motivadora e que impeliram e impregnaram as muitas ações realizadas.
Nesta perspectiva, procurou-se “ler”, de forma sistemática e com metodologia, todas as manifestações e reações humanas ao espaço que habitam e suas inúmeras externalidades.
Constata-se, desde sempre, que a monumentalidade das cidades, representada pelos seus marcos edificados nas mais variadas épocas, antes referências para se reconhecer e traduzir a cidade, com passar do tempo e com o aumento da velocidade, da tipologia e da densidade no deslocamento, ficaram cada vez mais difíceis de serem percebidos e identificados.
A não percepção das conexões entre as partes que “ligam” a cidade, foi acontecendo pela ruptura urbana causada pelos espaços de circulação cada vez mais vorazmente alargados, pela alta carga de tensão perceptível (ruído, poluição etc.) provocada pelo padrão do deslocamento reinante ou ainda, mais recentemente, pela dependência patológica da comunicação segregada - olhos sempre postos nas telas de smartphones, tudo isso contribuiu para a perda da referência, de lisibilidade e a redução da possibilidade de intervenção efetiva no espaço habitado, restando para o cidadão, um ser transportado, a mera consciência da origem e do destino.
Recentemente, algumas manifestações vêm, de forma diferente, mas com o mesmo resultado, provocando alguma revolução na relação monumentalidade/percepção do espaço.
Além da proliferação e uso, consentido ou não, do grafite, carregado de elementos de critica, de expressão artística, de tomada de território, vimos surgir alguns elementos tão ou mais transitórios, que emergiram na malha urbana, deixando marcas imaginárias, antes de sumirem ou deslocarem-se para outros pontos.
Temos o “pato amarelo” e outros infláveis como exemplo. Se, por um lado, marcava o cenário urbano, não servia para referenciar espaços, mas antes para emprestar significados a eles, reforçando e às vezes desnudando o espaço existente. São os “neo-monumentos” a participar da leitura da cidade.
Se vamos falar em transitoriedade, podemos lembrar de outro fenômeno recente que impacta no referencial visual e semântico das cidades: os “food trucks”.
Eles dão mobilidade relativa ao comércio de comida, ocupam lugares com destinação diversa à atividade de alimentação/recreação, contribuindo para uma valorização e melhor percepção, pelos usuários ou não, do espaço circundante.
Estes novos catalisadores da leitura urbana talvez ainda não sejam suficientes para a melhor compreensão do espaço urbano, suas ligações, evoluções, discrepâncias e desigualdades latentes. Quando readquirida, esta percepção dará ao cidadão a real dimensão da desigualdade, exclusão e iniquidade no uso da cidade.
*Antonio Maurício, engenheiro mecânico e de produção. Especialista em Planejamento e Gestão Pública; Transportes; Transportes Urbanos; Portos; Desenvolvimento Urbano e Políticas Públicas
Fonte - Portogente 22/08/2017
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