segunda-feira, 2 de junho de 2014

Defensoria denuncia retirada de moradores de rua em Salvador

Direitos humanos

Mulher dorme em cama improvisada em canteiro da estação do metrô, em Nazaré - O documento, assinado pelas defensoras públicas Fabiana Miranda, Alexandra Soares e Bethânia Ferreira, foi baseado em depoimentos de pessoas em situação de rua, colhidos durante o segundo semestre do ano passado e início deste ano.

Luana Almeida - A Tarde
Raul Spinassé | Ag. A TARDE
A Defensoria Pública do Estado da Bahia propôs ação civil pública contra o município, por conta da retirada deliberada de moradores de rua do Centro da cidade e arredores da Arena Fonte Nova. O motivo para a "limpeza humana" seria a realização dos jogos da Copa do Mundo.
O titular da Secretaria de Promoção Social e de Combate à Pobreza (Semps), Henrique Trindade, afirmou que as denúncias não procedem.
O documento, assinado pelas defensoras públicas Fabiana Miranda, Alexandra Soares e Bethânia Ferreira, foi baseado em depoimentos de pessoas em situação de rua, colhidos durante o segundo semestre do ano passado e início deste ano.
Nos relatos apresentados na ação, os moradores de rua afirmam que estariam sendo retirados à força de viadutos e marquises desde março deste ano. Para tanto, os agentes municipais estariam utilizando caminhões da Empresa de Limpeza Urbana do Salvador (Limpurb) para recolher papelões e pertences dos moradores de rua.
Em caso de resistência, estariam soltando jatos de água ou acionando agentes da Guarda Municipal para a retirada das ruas, dizem os relatos. Depois, seriam levados em veículos do tipo Kombi, com a marca da Prefeitura.
De acordo com a defensora pública Fabiana Miranda, responsável pela Equipe Multidisciplinar de Atendimento à População em Situação de Rua, o local onde essas pessoas são deixadas ainda é uma incógnita.
"Por meio dos relatos, conseguimos identificar que eles são levados para abrigos da prefeitura e, em alguns casos, são deixados em chácaras situadas em Simões Filho, Mata de São João e Candeias. Porém, não foi possível chegar a esses lugares, pois nem os denunciantes sabem ao certo a localização deles", afirmou.
Ainda de acordo com a defensora, há, também, histórias que envolvem falsas promessas: "Os moradores de rua relataram ter ouvido promessas de que, se entrassem no veículo, seriam aceitos em programas como o Programa Minha Casa, Minha Vida".

Represálias
A equipe de reportagem de A TARDE percorreu ruas do Centro e ouviu moradores de rua, que confirmaram a denúncia da Defensoria Pública. Único a aceitar se identificar, Ubiraci Alves Gomes, 30 anos, que dorme sob o viaduto dos Engenheiros - que dá acesso a Nazaré -, disse que já foi abordado de forma violenta por três vezes.
"Eles oferecem ajuda, consulta com médico. Quando neguei, vieram me agredir, mas consegui fugir. Não sei para onde querem me levar, tenho medo", contou. A presidente do Movimento Nacional da População em Situação de Rua, Maria Lúcia Pereira, confirma as denúncias.
Segundo ela, a ação da prefeitura dá continuidade à "limpeza humana" iniciada em 2013, durante a Copa das Confederações. Na ocasião, a prefeitura foi acusada de usar o imóvel da antiga Casa de Saúde Ana Nery, no largo da Soledade, como "depósito" de pessoas em situação de rua.
A ação civil pública proposta pela Defensoria contesta, ainda, a utilização de antigos motéis, localizados nos bairros de Itapuã e Pau da Lima, como unidade de acolhimento da prefeitura.
De acordo com a defensora pública Fabiana Miranda, os abrigos não obedecem às normas do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, sobretudo no que diz respeito ao número de abrigados, que deve ser de até 50 pessoas.
"Hoje, esses lugares contam com mais de 26 famílias. Os quartos têm ar condicionado, espelhos e conforto. No entanto, a equipe de assistentes sociais detectou que há pessoas além do limite aceitável", afirmou.
O secretário Henrique Trindade, no entanto, considera as unidades como adequadas e afirma que elas dispõem de todos os serviços exigidos pelas normas federais.

Foco municipal é reaproximar moradores de rua de familiares
O secretário Trindade rechaça as acusações de que os moradores de rua estariam sendo levados contra a vontade. “Não tenho conhecimento da existência dessa ação. Contamos, sim, com uma equipe de abordagem, que vai às ruas diariamente”, rebateu.
Segundo o secretário, o foco das ações do município está na reinclusão dessas pessoas nas suas famílias. “Não objetivamos ‘maquiar’ a cidade para a Copa do Mundo. Tentamos intermediar o diálogo entre as duas partes. Enquanto isso, oferecemos abrigos”, esclareceu.
O secretário nega que os moradores de rua estejam sendo enviados contra a vontade a outros municípios. “Nossa atuação está restrita a Salvador. As pessoas só são levadas se concordarem. Se houver comprovação de ações desse tipo por parte da prefeitura, ponho meu cargo à disposição”, disse.
“Temos condições de estada e convívio para acolher com privacidade pessoas em situação de rua e desabrigo por abandono. Dispomos, ainda, de uma equipe capacitada para auxiliar em serviços sociais, como cadastramento em programas como o Bolsa Família e para encaminhá-los para obter documentação”, explicou.

Ex-motel
Antiga moradora de rua, a paraibana Eliene Guimarães, 40, é uma das primeiras abrigadas na unidade de acolhimento de Itapuã. Ela conta que chegou ao local por livre e espontânea vontade.
“Uma equipe me abordou e informou sobre este abrigo. Estava cansada de ser andarilha. Aqui, tenho comida e um quarto de luxo, que tem até ar condicionado. Não quero mais sair”, disse.
Fonte - A Tarde  02/06/2014

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